A Receita Federal vai aplicar de
forma retroativa a nova norma sobre o Regime Tributário de Transição (RTT). Com
esse entendimento, o órgão poderá, com base na Instrução Normativa (IN) nº
1.397, cobrar impostos federais na distribuição de dividendos e juros sobre o
capital próprio que não foram recolhidos desde 2008. A norma foi publicada na
terça-feira no Diário Oficial da União (DOU).
Segundo antecipou o Valor,
advogados especialistas em tributação que representam grandes empresas de
capital aberto na Justiça já temiam que a norma fosse usada com esse objetivo e
previam ações judiciais para questionar a instrução
normativa.
A norma estabelece que estão
isentos somente os dividendos pagos até o limite do lucro fiscal - aquele
apurado de acordo com a regra vigente antes da alteração da Lei das Sociedades
Anônimas, em 2007, pela Lei nº 11.638.
O problema atinge empresas que
distribuem seus dividendos com base no lucro societário, calculado de acordo com
as normas internacionais de contabilidade. Como geralmente esse lucro societário
é maior do que o fiscal, o valor distribuído pode ultrapassar o limite de
isenção.
Em vigor desde 2008, o RTT foi
criado justamente para garantir neutralidade do ponto de vista fiscal, após a
adoção das normas internacionais de contabilidade pelo Brasil. Dessa maneira,
não poderia aumentar ou diminuir a arrecadação
tributária.
De acordo com o subsecretário
substituto de Tributação e do Contencioso da Receita Federal, Fernando Mombelli,
a instrução normativa não foi feita com "intuito arrecadatório". "E tampouco
temos previsão de, a curto prazo, fazer qualquer tipo de ação [força-tarefa]",
disse Mombelli, acrescentando que "não há nenhuma majoração de impostos" com a
nova IN".
A partir de agora, as empresas
deverão apurar se distribuíram dividendos com a isenção de impostos acima do
limite, segundo a instrução normativa, e informar a pessoa ou a empresa que
recebeu o dinheiro para que faça uma eventual retificação. Se não for feita,
multas e juros incidirão sobre o montante.
A instrução normativa atinge cerca
de 600 empresas, segundo a Receita. São companhias de capital aberto e aquelas
com faturamento anual superior a R$ 300 milhões e R$ 240 milhões ou mais
em ativos.
Mombelli não estimou, porém, o valor da possível arrecadação
suplementar.
Para o subsecretário substituto de
Fiscalização da Receita, Iágaro Martins, a instrução normativa não muda nada em
relação aos balanços: "Só não estavam com duas contabilidades quem não estava
fazendo corretamente", disse. Segundo ele, a Receita sempre esteve disponível
para atender empresas com dúvidas sobre qual lucro deveria ser utilizado para a
distribuição de dividendos com isenção, mas não foi
procurada.
O Conselho Federal de
Contabilidade (CFC), porém, considera um "retrocesso" a decisão da Receita de
obrigar as empresas a ter duas contabilidades completas paralelas (e não apenas
a reconciliação já existente, por meio do FCont), uma societária e outra fiscal.
O posicionamento consta de comunicado assinado pelo presidente da entidade,
Juarez Domingos Carneiro. Nele, o CFC pede a reabertura do diálogo com o Fisco
"para completo reestudo do conteúdo da instrução normativa".
Fonte: artigo de Fernando
Torres para o Valor Econômico